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Gabriel Chedid Alves Moura

Acarajé: herança africana tem alto valor nutritivo

O acarajé é um prato tradicional brasileiro fortemente ligado ao estado da Bahia. O acarajé tem raízes na culinária africana, especificamente do povo iorubá da região do Golfo do Benin, trazido ao Brasil por africanos escravizados. Possui significado cultural e religioso no Candomblé, religião afro-brasileira, em que é oferecido aos orixás (divindades).


A palavra acarajé tem origem no idioma iorubá e significa akará “bola de fogo” e jé “comer”. A união dos significados resulta em “comer bola de fogo”. A referência está ligada a aparência do bolinho de feijão frito que possui tons vermelho alaranjandos devido ao azeite de dendê que é rico em Vitamina A e corotenóides.


É uma espécie de bolinho feito com feijão-fradinho, cebola e sal, que é moldado em bolinhas e frito em azeite de dendê (óleo de palma). O acarajé normalmente é aberto e recheado com vatapá (uma pasta cremosa feita de pão, camarão, leite de coco, amendoim moído e óleo de palma) e caruru (feito de quiabo, cebola, camarão e óleo de palma). Muitas vezes é servido com camarão seco e pimenta.


Este prato é popular como comida de rua, principalmente em Salvador, na Bahia, onde é vendido pelas baianas de acarajé, mulheres vestidas com as tradicionais roupas brancas. A função de “baiana do acarajé” é considerada um patrimônio imaterial nacional. A combinação de sabores e texturas faz do acarajé uma parte querida e icônica da herança culinária brasileira.


O acarajé possui alto valor nutritivo. O seu preparo envolve a adição de vários ingredientes, mencionados acima, que possuem macro e micronutrientes importantes para a manutenção da saúde. Dentre os que se destacam:

  • Azeite de dendê: fonte de vitamina E, tocoferois e tocotrienos. Atuam como antioxidantes combatendo radicais livres;

  • Feijão-fradinho: fonte de proteínas, carboidratos e fibras alimentares, além de baixa concentração de gordura;

  • Quiabo: fonte de vitaminas do complexo B, vitamina C e cálcio;

  • Pimenta: carotenóides, vitamina A, tocoferol, cálcio, ferro, tiamina, niacina, riboflavina e fibras;

  • Leite de coco: proteínas, fibras e sais minerais;

  • Camarão: fonte de proteína.


É impossível descrever o acarajé sem abordar um dos seus principais ingredientes, o azeite de dênde. O azeite de dendê, também conhecido como óleo de palma, é extraído dos frutos da palma de dendê (Elaeis guineensis). A origem do referido óleo é a África Ocidental, onde a palmeira de dendê é nativa. A ocorrência do dendezeiro se estende por toda Costa Africana. A economia do continente africano depende muito da palmeira, uma vez que ocorre o aproveitamento integral de múltiplas partes que compõe a árvore. Folhas, troncos, semente, frutos são comercializados.


Dois produtos são extraídos do fruto do dendê: o azeite de dendê, extraído do mesocarpo e óleo de palmiste, retirado da semente. Tradicionalmente, o óleo de palma é produzido de forma artesanal com uma técnica de origem africana. O fruto é cozido, macerado e batido no pilão de forma manual. Com a evolução tecnológica, ocorreu um melhoramento do rigor técnico.


O azeite de dendê foi incorporado na culinária brasileira através de um longo processo histórico e sociocultural. O trabalho das mulheres escravizadas nos afazeres domésticos dos aposentos dos senhores portugueses explica a inserção desse ingrediente nos hábitos alimentares brasileiros. Posteriormente, a venda ambulante de comida nas ruas, chamada de “ganhos” nas principais cidades como Salvador, Recife e Rio de Janeiro consolidou o consumo do ingrediente no Brasil.


O feijão consiste em uma leguminosa que possui uma grande variedade de tipos. É um alimento característico presente na mesa dos brasileiros. Dentre a ampla diversidade, se destaca o feijão caupi, ingrediente crucial no preparo do acarajé. Conhecido como feijão-frade, ou ainda, feijão-fradinho (Vigna unguiculata), a maior parte da produção mundial desse tipo de feijão é ocorre na África e isso justifica a origem do acarajé, enquanto um prato característico africano. No Brasil a região nordeste se destaca na produção e no consumo nacional dessa leguminosa. A combinação perfeita entre feijão e azeite de dendê resulta no emblemático acarajé.


As calorias oferecidas por uma porção de acarajé variam muito devido a alguns fatores. O primeiro deles diz respeito à quantidade de ingredientes que são adicionados em cada preparo. Não existe um padrão ou uma receita de referência para a comercialização do prato. O segundo fator se relaciona à forma como o bolinho será servido. O acarajé pode ser consumido puro, só o bolinho de feijão-fradinho ou acompanhado com os recheios e acompanhamentos. Tais fatores justificam uma certa discrepância nos valores encontrados nas análises de composição centesimal de alimentos, que têm por objetivo quantificar a umidade, proteína, cinzas (minerais), carboidrato e lipídeos. O acarajé sem acompanhamento tem um valor calórico de 271,80 kcal, correspondente a uma porção de 100 gramas. Já o acarajé acompnhado por vatapá e salada tem uma média de 214,38 kcal em 100 gramas.


É importante esclarecer que apesar da presença de muitos nutrientes importantes para a saúde, o consumo do acarajé deve ser feito de forma moderada. A técnica de preparo do bolinho envolve a fritura por imersão no azeite de dênde, o que contribui para a incorporação desse azeite no acarajé. O alto teor de lipídeos encontrados nas análises de composição do acarajé são provenientes da fritura e não dos ingredientes adicionados na formulação.


O oléo de palma consiste em um lipídeo com alto teor de ácidos graxos saturados. As gorduras saturadas são lipídeos sólidos à temperatura ambiente (25ºC) e seu consumo excessivo está relacionado ao desenvolvimento de Doenças Crônicas Não-Transmissíveis (DCNTs). Quando consmida em excesso, tais gorduras tendem a se depositarem nas paredes dos vasos sanguíneos prejudicando a circulação sanguínea.


Outro fato observado é que a fritura tem o poder de diminuir o percentual de minerais presentes no bolinho de feijão. Apesar de serem estáveis ao calor, os minerais acabam sofrendo o processo de lixiviação, que consiste na perda de nutrientes por meio da extração ou solubilização dos minerais no oléo de fritura. Dessa forma, a quantidade de minerais nas amostras prontas para o consumo e nas amostras ainda cruas são diferentes.


Portanto, o acarajé é mais do que uma deliciosa comida de rua brasileira: é um símbolo do patrimônio cultural e da história. Com suas raízes africanas e papel significativo nas práticas religiosas afro-brasileiras, o acarajé representa a rica e diversificada cultura brasileira. Desfrutar de um acarajé é saborear um pedaço dessa tradição vibrante, com sua mistura única de sabores e profundo significado cultural. Seu consumo deve ser feito moderadamente devido à técnica de preparo do bolinho que envolve a fritura. É importante destacar que nenhum alimento isoladamente tem o potencial de causar um dano grave à saúde. Existe um contexto alimentar associado a um estilo de vida que podem ser benéficos ou prejudiciais à saúde.


REFERÊNCIAS:


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