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Biltong: o petisco saboroso da África do Sul

  • Debora Rodrigues Silveira
  • 30 de jun. de 2024
  • 6 min de leitura

Hoje vamos viajar para África do Sul e aprender um pouco mais sobre um alimento típico desse país tão diverso! Você conhece o Biltong? Nessa nova aventura, iremos conhecer os princípios tecnológicos que compõem o biltong e sua análise comparada a carne de sol brasileira. Prontos para descascar a ciência hoje?

 

O que é?


O biltong é um petisco de carne seca em tiras, tradicional sul-africano, feito de filés crus. A carne utilizada é diversa, podendo ser desde carne bovina até carne de avestruz ou de outras caças. Esse alimento possui um processo tecnológico de preparação parecido com a nossa conhecida “carne de sol”, “carne seca” ou “charque”, consumida aqui no Brasil, com algumas diferenças de sabor.


Como é o processo de produção?


Para o processo de cura da carne, é utilizado o princípio tecnológico de adição de soluto, como o sal e o açúcar. Você conhece esse método? Esse método de conservação de alimentos é muito antigo, realizado com o objetivo de manter certos alimentos perecíveis disponíveis para consumo por mais tempo, ou seja, para prolongar a validade. Mas como funciona? A adição do soluto reduz a quantidade de água livre no alimento, ocorrendo uma migração dela sem a retirada da mesma, uma vez que o princípio da osmose faz com que a água migre do meio menos concentrado para o mais concentrado. Ou seja, a água sai do meio do alimento e vai para onde tem mais soluto, o sal adicionado no exterior. O sal “captura” essa água livre e a torna indisponível para a proliferação de microrganismos, o que evita a rápida deterioração do alimento. Essa prática pode ser chamada de salga, conhecido também por desidratação osmótica na área química.


Para a preparação do biltong, são feitos alguns passos: cura, adição de tempero e secagem. A cura é feita pela adição de sal e de vinagre, ambos utilizados com o objetivo antimicrobiano, e a carne fica nessa solução por algumas horas. Logo após, é feita a adição de temperos, normalmente é uma mistura de especiarias da região, como pimenta-do-reino e coentro, que dão o sabor característico do petisco. Enfim, é feita a secagem, o processo mais longo, em que a carne fica pendurada em tiras durante vários dias em um ambiente com umidade e temperatura controlada.


Contexto do Método…


Lançando um olhar ao passado, você sabia que essa tecnologia de processamento de carnes é muito antiga? Provavelmente, essa técnica é originada no sul da Europa, em países próximos ao mar Mediterrâneo, devido ao clima que possibilitaria a secagem de forma natural. Também há relatos de utilização de fumaça, em países em que o clima frio não era favorável. Esse método foi referenciado pelos sumérios há 2.000 anos a.C, ao escrever sobre carne de porco seca!


O objetivo era fazer com que as carnes obtidas pela caça ou pelos rebanhos durassem por mais tempo, já que naquela época não havia geladeira! Com a necessidade de preservar o alimento por mais tempo, eles começaram a utilizar o sal e o clima do ambiente como uma forma de desidratar.


Aqui no Brasil, durante o período colonial, foi introduzida essa prática de conservação, inicialmente no Nordeste. Com a interiorização do Brasil, esse método também foi se espalhando até chegar no Sul. Atualmente no Brasil, existem 3 tipos de carnes que utilizam essa técnica: a carne seca, a carne de sol e o charque. Cada um tem sua peculiaridade e sua preparação, que gera um produto final com características sensoriais diferentes.


A carne de sol brasileira possui uma preparação parecida com o biltong e é um alimento típico do nordeste do país! Ao invés de tiras, a carne é cortada em pedaços longos e pouco espessos. A salga é feita manualmente, colocando sal em toda superfície e perfurando a carne para o sal aprofundar também. Após a cura, as tiras de carne são penduradas para escorrer a salmoura e permanecem assim para ocorrer a desidratação, expostas ao sol.

 


Entendendo um pouco mais…  

       

Você conhece a “atividade de água” dos alimentos (ou “Aw”, sigla muita utilizada que vem da expressão em inglês “water activity”)? A atividade de água, ou Aw, representa a água livre dentro dos alimentos, e é esta quem permite que ocorram reações enzimáticas e de crescimento microbiano no alimento. A água é considerada o solvente universal, em que ocorrem todas as reações do metabolismo dos seres vivos. Dessa forma, no alimento a água deve estar disponível, sem estar ligada a outras substâncias químicas, para que as reações químicas e dos microrganismos possam ocorrer. Nenhum microrganismo cresce em ambiente totalmente seco!


A Aw está relacionada com a estabilidade do alimento, ou seja, quanto maior a atividade de água, mais água livre e mais perecível pode ser o alimento, logo, reduzir a atividade de água aumenta a validade do alimento. E dentre as diferentes tecnologias existentes, podemos utilizar o princípio tecnológico da adição do soluto!


Uma pergunta importante: como diminuir a água livre de um alimento? Relembrando o que já aprendemos, a adição de sal à carne faz com que a água livre dela se torne indisponível devido ao aumento da concentração de soluto. Assim, ocorre a Aw diminui e o alimento se torna mais estável, podendo ser conservado por mais tempo! Por isso que essa técnica é utilizada há tanto tempo!


As bactérias precisam de uma Aw mínima de 0,91 e a carne fresca possui Aw de 0,95, ou seja, muito favorável para o crescimento microbiano. Quando a carne passa pelo processo de cura, a Aw cai para 0,90, e apesar de essa redução da disponibilidade de água parecer pequena, é suficiente para reduzir ou retardar a atividade de microrganismos presentes. Com isso, a vida útil da carne passa de dias para semanas, somente com esse processo! Incrível, não é?


No biltong, a carne utilizada para a cura é fresca e crua, logo, há grande composição microbiana. Porém, com os processos utilizados aliados a outros tipos de barreiras, como por exemplo as embalagens, o produto final torna-se seguro de ser consumido!

 

O que mais podemos saber?


O biltong é um produto cárneo muito saboroso, sendo consumido como petisco ou um lanche saboroso. Esse alimento é rico em proteínas, por ser um produto cárneo, e apresenta aproximadamente entre 50 a 66% de proteína em sua composição. É um produto rico em ferro e possui quantidades significativas de zinco e de potássio, quando sua base é carne bovina.


Quanto à carne de sol, essa é composta de cerca de 23% de proteína, apresentando um percentual bem abaixo em relação ao biltong. Mas, também é um alimento rico em ferro, zinco e potássio, micronutrientes necessários para a manutenção da saúde.


É importante consumir esses alimentos com muita cautela e moderação, uma vez que são ricos em sódio devido seu processo de preparação! A porção de 100 gramas de carne de sol possui aproximadamente 1.443 mg de sódio e a recomendação de consumo diário deve estar abaixo de 2.400 mg, ou seja, essa porção atinge cerca de 60% da recomendação diária!


E aí, o que achou de conhecer um pouco mais sobre o biltong e sua familiaridade com a nossa carne de sol? Curtiu? Compartilhe com mais pessoas sobre esse novo conhecimento! É sempre um prazer descascar a ciência com você.

 

REFERÊNCIAS

 

CARELLE, A. C. Tecnologia dos Alimentos: Principais Etapas da Cadeia Produtiva. Ed. Erica/Saraiva. 2015.

 

FELLOWS, P.J. Tecnologia do Processamento de Alimentos: Princípos e Prática. Ed. Artmed. 2018.

 

Jones M, Arnaud E, Gouws P, Hoffman LC. Processing of South African biltong – A review. South African Journal of Animal Science. 2017 Nov 9; 47(No. 6).

 

Toldrá F. Dry-Cured Meat Products. John Wiley & Sons; 2008. (Pag. 3-5)

 

Karolenko C, DeSilva U, Muriana PM. Microbial Profiling of Biltong Processing Using Culture-Dependent and Culture-Independent Microbiome Analysis. Foods. 2023 Feb 16;12(4):844.

 

Gavai K, Karolenko C, Muriana PM. Effect of Biltong Dried Beef Processing on the Reduction of Listeria monocytogenes, E. coli O157:H7, and Staphylococcus aureus, and the Contribution of the Major Marinade Components. Microorganisms. 2022 Jun 28;10(7):1308. doi: 10.3390/microorganisms10071308. PMID: 35889027; PMCID: PMC9321169.

 

Halliburton WD. THE COMPOSITION AND NUTRITIVE VALUE OF BILTONG. Br Med J. 1902 Apr 12;1(2154):880-2. doi: 10.1136/bmj.1.2154.880. PMID: 20760176; PMCID: PMC2512103.

 

USDA – United States Department of Agriculture. Disponível em: <http//:www.usda.gov>. Acesso em: 07 de junho 2024.

 

da Câmara Cascudo L. História da alimentação no Brasil. 1° Edição Digital. São Paulo: Global Editora; 2016.

 

TACO. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos. Versão 4. Unicamp, São Paulo,

2011.

 
 
 

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