FLAVONOIDES NA ALIMENTAÇÃO
- Ciência Descascada
- 12 de nov. de 2023
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Os flavonoides são pigmentos naturais presentes na maioria das plantas, cuja síntese não ocorre na espécie humana. Eles desempenham um papel fundamental na proteção contra agentes oxidantes como raios ultravioletas, a poluição ambiental e substâncias químicas presentes nos alimentos. Participam ainda de importantes funções no crescimento, desenvolvimento e na defesa dos vegetais contra o ataque de patógenos (Fonseca et al., 2016). São conhecidos, atualmente, mais 8.000 diferentes tipos de flavonoides, sendo as suas principais classes os flavonóis, isoflavonas, flavonas, flavanonas, flavanas, antocianinas e proantocianidinas (ou taninos condensados), e podem ser encontrados em plantas, frutas, vegetais, sementes, flores, chás, vinho, própolis e mel (Oliveira et al., 2006).
Estrutura Química

A estrutura química dos flavonoides está baseada no núcleo flavilium, o qual consiste de três anéis fenólicos. O benzeno do primeiro anel é condensado com o sexto carbono do terceiro anel, que na posição 2 carrega um grupo fenila como substituto. O terceiro anel pode ser um pirano heterocíclico, gerando as estruturas básicas das leucoantocianinas e das antocianidinas, denominado de núcleo flavana. Devido ao fato do terceiro anel apresentar-se como uma pirona, ocorre a formação das flavonas, flavonóis, flavanonas, isoflavonas, chalconas e auronas, recebendo a denominação de núcleo 4-oxo-flavonóide (Aherne, O’brien, 2002)
As atividades bioquímicas dos flavonoides e de seus metabólitos dependem de sua estrutura química, que podem variar com substituições incluindo hidrogenação, hidroxilações, metilações, malonilações, sulfatações e glicosilações (Birt; Hendrich; Wang, 2001)
O preparo dos alimentos para consumo pode, algumas vezes, resultar em perdas destes compostos, em maior ou menor grau, variando de acordo com o tipo de alimento e o tipo de preparo empregado. Todavia, os flavonoides são compostos relativamente estáveis, pois resistem à oxidação, altas temperaturas e moderadas variações de acidez (Peterson; Dwyer, 1998). Flavonoides e isoflavonoides compreendem uma classe de fitoquímicos que não podem ser sintetizados por humanos, ocorrendo somente através da ingestão dietética (Peterson; Dwyer, 1998; Birt; Hendrich; Wang, 2001).
Atividades Biológicas
Os flavonoides estão relacionados com uma grande variedade de atividades biológicas, destacando-se a ação antioxidante, anti-inflamatória, inibição do ciclo celular entre outras.
Sua ação biológica de maior relevância é sua atividade antioxidante: atuam como sequestradores de radicais livres e como quelantes de metais, retardando reações de degradação celular por oxidação (Huber & Rodriguez-Amaya, 2008). A oxidação celular ocorre entre o oxigênio atmosférico e os ácidos graxos insaturados, onde o oxigênio adiciona-se ao radical livre e forma um radical peróxido. A oxidação é a transferência de elétrons de um átomo para outro, sendo o oxigênio o principal receptor no sistema de fluxo de elétrons, que produz energia na forma de ATP. Contudo, quando elétrons nesse fluxo ficam desemparelhados, podem gerar radicais livres, moléculas instáveis devido às suas valências livres (Sen et al., 2010). Os radicais livres podem acumular-se e reagir ativamente com outras moléculas, como proteínas, lipídios e o próprio DNA, as desestabilizando, o que pode estimular o surgimento de diversas doenças em diferentes partes do corpo, tais quais as doenças degenerativas como a doença de Alzheimer. Os flavonoides podem reduzir o estresse oxidativo gerado quando há reação entre os radicais livres e moléculas como lipídios, proteínas ou ácidos nucléicos, o que pode causar danos à membrana das células (Ullah et al., 2020). Em resumo, flavonoides antioxidantes agem neutralizando os radicais livres, impedindo sua ação (Alves et al., 2010)
A função anti-inflamatória desempenhada pelos flavonoides é de notável importância, uma vez que esses compostos poderiam ser uma opção de escolha no tratamento dos processos inflamatórios, reação fisiológica a uma variedade de estímulos como infecção e danos teciduais (Goldsby et al., 2008). Os flavonoides atuam como inibidores das enzimas fosfolipase A2 (PLA2), 8 lipo-oxigenase, ciclo-oxigenase (COX) e da produção de óxido nítrico os quais desempenham um papel importante como mediadores inflamatórios (Dos Santos; Farias Rodrigues, 2017).
A atividade de inibição do ciclo celular, tem sido descrita por Birt, Hendrich, Wang, (2001) que descreve a proliferação celular desregulada como um marcador de aumento da susceptibilidade à neoplasia. A prevenção do câncer geralmente está associada com inibição, reversão ou retardamento da hiperproliferação celular. Os flavonoides e isoflavonoides têm demonstrado inibir a proliferação de linhagens de células cancerosas humanas. Além disso, Flavonoides e isoflavonoides podem inibir o ciclo celular e induzir a apoptose, linhagens de células cancerosas onde as células estavam em divisão, quando tratadas com flavonoides e isoflavonoides tiveram uma desestruturação nos “check-points” G1/S e G2/M. O flavonóide quercetina bloqueia o ciclo celular em G1/S de células cancerosas de cólon. Ela também induz apoptose, resultado da fragmentação nuclear e condensação da cromatina nuclear (Reddy, Odhav, Bhoola, 2003).
Fontes de obtenção

Suas fontes de obtenção são variadas dentre estas, incluem:
Chás: os chás possuem considerável quantidade de flavonoides, apesar desta ainda não ser precisa, e constitui a principal fonte de flavonoides da dieta oriental. O consumo de chá é um hábito antigo, principalmente na população oriental, sendo considerada a segunda bebida mais consumida no mundo, depois da água (Cherubini et al., 1999; Dreosti et al., 2000; Dufresesne et al.,2001). Existem dois tipos principais de chás: chá verde (Camellia senensis) consumido quase que exclusivamente na Ásia e em países norte-africanos, cujos principais flavonoides são as catequinas e flavonol glicosídico; chá preto, representando aproximadamente 80% do consumo no mundo inteiro, cujos flavonoides são as catequinas que, com o processo de fermentação, são enzimaticamente oxidadas, formando teaflavona e bisflavodsand thearubigin (Cherubini et al., 1999; Dreosti et al., 2000). Em estudos animais, tanto o chá preto como o chá verde parecem apresentar a mesma eficácia na prevenção da tumorogênese (Wiseman et al., 2001).
Uvas e vinhos: os compostos polifenólicos são encontrados em mais quantidade em vinhos tintos (1000-4000mg/l) que em vinhos brancos (200-300mg/l), estando em sua maioria solubilizados em água. Os principais flavonoides das uvas e, consequentemente, dos vinhos são os flavonoides, ácidos fenólicos, antocianinas, encontrados na casca, e catequinas, encontradas nas sementes e polpa. Também são encontradas proantocianinas, epicatequina, malvidina, cianidina, miricetina e quercetina. (Dreosti et al., 2000).
Cacau: os compostos fenólicos do cacau são os flavonóis monoméricos, epicatequina, procianidina oligomérica, flavona, antocianina e quercetina glicosídica (Dreosti et al., 2000). Soja: os principais flavonoides da soja são a isoflavona e seus derivados daidzeína, genisteína e gliciteína (Setchell, 1998).
Flavonoides em medicamentos

Há disponível no mercado certos medicamentos que possuem como principal ativo o flavonoide. Os flavonoides mais utilizados na manipulação de fórmulas terapêuticas são as isoflavonas. As isoflavonas podem ser encontradas em leguminosas, principalmente na soja (Glycine max), sendo que as principais são a daidzeína, e genisteína e a gliciteína, as quais possuem alto valor terapêutico para o tratamento de doenças crônicas tais como câncer, diabetes mellitus, osteoporose e doenças cardiovasculares ( Moraes et al.,2022).
Além disso, tem sido usado juntamente com outros componentes para fins fitoterápicos, como por exemplo no medicamento fitoterápico Passiflora que possui ação ansiolítica. A Passiflora, é uma espécie de planta que é obtida da flor do maracujá, é considerada uma planta medicinal amplamente estudada devido à sua complexa composição química, que inclui flavonoides, alcaloides e carboidratos, com muitos de seus benefícios e mecanismos de ação ainda não completamente compreendidos (Miroddi et al., 2013).
Dessa forma, nota-se o grande papel e importância dos flavonoides para a saúde humana, na qual não se limita apenas na alimentação, mas também possui possibilidades de uso e aplicações em outras áreas, como medicamentos. Além disso, possui diversos benefícios para a saúde devido aos seus compostos químicos, podendo atuar como antioxidante, antitumoral, anti inflamatória e muitos outros. Diante disso, o consumo de compostos bioativos como os flavonoides podem se tornar um grande aliado para a saúde, juntamente a uma alimentação equilibrada, variada e a prática de atividades físicas regulares contribuem para uma qualidade de vida melhor. Vale ressaltar, que é importante verificar com profissional de saúde qualificado a necessidade de suplementação ou uso medicamentoso dos flavonoides.
Referências
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