JAMBU: A Ciência por traz de sensação de formigamento
- Maria Fernanda Felipe de Carvalho
- há 14 horas
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A espécie Acmella oleracea, popularmente conhecida como jambu, agrião-do-pará, agrião-do-norte, agrião-do-brasil, abecedária ou jambuaçu, é uma Planta Alimentícia Não Convencional (PANC) amplamente cultivada e consumida na região Norte do Brasil e em outras regiões tropicais próximas à linha do Equador na África, na Ásia e na América do Sul. É uma planta de porte pequeno, atingindo geralmente entre 30 e 40 cm de altura, com crescimento semi ereto ou até rasteiro, caule cilíndrico, carnoso e com ramos decumbentes. As folhas crescem em pares opostos ao longo do caule, são finas (membranáceas) e possuem pecíolo.
O jambu destaca-se por sua relevância cultural e econômica, especialmente pelo aproveitamento de suas folhas, caules e sementes, que podem ser utilizadas na extração de óleo vegetal. As folhas apresentam um sabor intenso e característico, com amargor sutil, semelhante ao do agrião, porém mais acentuado, propriedades que podem ser muito aproveitadas na culinária. É um ingrediente essencial na culinária típica da região Norte, presente em pratos tradicionais como o tacacá e o pato no tucupi, além de ser utilizado na produção de sobremesas e bebidas, como a famosa e apreciada cachaça de jambu, em sopas ou cruas em saladas.
Acmella oleracea é uma hortaliça rica em vitaminas (A, B1, B12, C, niacina) e minerais (ferro, cálcio, fósforo), com baixo valor calórico. Devido ao seu alto teor de umidade, tem vida útil curta, e pode ser interessante técnicas de conservação, como a secagem, que remove parte da água, reduz a atividade de água e aumenta o tempo de prateleira, além de facilitar o transporte e armazenamento. Apesar de ajudar na conservação, a secagem exige cuidados, pois microrganismos podem resistir se o alimento for mal processado.

O consumo dos produtos alimentícios que contêm o jambu como ingrediente provoca uma sensação de formigamento seguida de leve dormência nos lábios, na língua e na gengiva — um efeito sensorial marcante que torna o ingrediente único e muito desejado em diversas receitas. Essa experiência está relacionada à presença de alquilamidas, sendo o espilantol o constituinte mais representativo. O espilantol é um composto bioativo encontrado principalmente na folha da planta e a sensação de adormecimento ocorre devido à ação da ligação do espilantol aos canais dependentes de potássio com poro duplo, distribuídos por diversas células, responsáveis por controlar o potencial de repouso na excitabilidade celular — ou seja, ao se ligar a esses canais, o espilantol interfere na passagem de íons de potássio, alterando o equilíbrio elétrico das células e afetando principalmente a condução dos sinais nervosos, o que provoca a sensação temporária de formigamento ou dormência.

Além do seu uso na gastronomia, o jambu também é muito utilizado na medicina tradicional popular dos povos nativos da amazônia, na forma in natura, de chás, xaropes, extratos e tinturas, por possuir diversas propriedades benéficas para a saúde. Dentre os usos medicinais, destacam-se os efeitos analgésico, anestésico, anti-inflamatório e antimicrobiano. As flores da planta são tradicionalmente mastigadas para aliviar dores de dente, aftas, gengivites e outras infecções bucais devido ao espilantol, que, por ter ação direta sobre os canais de sódio neuronais e fibras nervosas periféricas, promove um efeito analgésico e anestésico local.
Além do efeito anestésico, também apresenta potencial anti-inflamatório, observado tanto na medicina popular quanto em estudos laboratoriais. Pesquisas in vitro indicam que o espilantol pode modular a resposta inflamatória, inibindo a produção de citocinas pró-inflamatórias, como o TNF-alfa e a interleucina-6 (IL-6), o que sugere uma atuação relevante em processos inflamatórios locais e sistêmicos leves. Essas propriedades explicam seu uso externo em casos de dores musculares e articulares em formulações naturais.
EFEITO AFRODISÍACO

O jambu, além de amplamente usado na culinária e medicina tradicional, possui efeito afrodisíaco — também devido à ação do espilantol, que proporciona formigamento e leve dormência, podendo intensificar a excitação sensorial. Produtos feitos com extrato concentrado de jambu, são usados tanto na alimentação quanto em aplicações tópicas no corpo, contribuindo para a lubrificação natural e ampliando o prazer em contextos íntimos. Essas características contribuem para sua reputação como um potencial estimulante natural das sensações táteis.
USO NA COSMÉTICA
O extrato de jambu também vem sendo amplamente explorado pela indústria cosmética, sendo empregado em máscaras faciais, cremes antissinais e séruns. Um efeito semelhante ao botox se dá pela capacidade do espilantol de inibir a contração dos músculos subcutâneos, o que suaviza rugas e linhas de expressão. A presença de polissacarídeos como a arabinogalactana também contribui para os benefícios à pele.
POTENCIAL INSETICIDA E ACARICIDA
Além disso, o jambu tem potencial inseticida e acaricida. Estudos demonstram que extratos da planta são eficazes contra ovos, larvas e pupas de mosquitos como o Aedes aegypti e o Anopheles spp., vetores de doenças como dengue e malária. Essa atividade se deve à ação do espilantol sobre o sistema nervoso dos insetos, provocando descoordenação e morte. Também foram observados efeitos sobre ácaros, que afetam tanto humanos quanto animais.
O jambu (Acmella oleracea) é seguro quando consumido moderadamente na alimentação, mas o uso excessivo, especialmente em formas concentradas (extratos, tinturas, suplementos), pode causar efeitos adversos. O seu principal composto bioativo, o espilantol, em altas doses pode provocar toxicidade celular, alterações comportamentais, efeitos gastrointestinais (como náuseas e diarreia). Alguns grupos populacionais devem ter mais cuidado com o consumo excessivo do jambu: gestantes e lactantes, devido à ausência de estudos conclusivos sobre a segurança do espilantol nesses períodos, crianças pequenas, que são mais sensíveis aos efeitos das substâncias bioativas e pessoas alérgicas à família Asteraceae. No consumo culinário, entretanto, é raro que se atinja quantidades elevadas, o que torna seu uso normalmente seguro nesse contexto.
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