Tem um furo no meu queijo: Vamos falar sobre o queijo Emmental?
- Kevin Costa Miranda
- 5 de mai. de 2024
- 7 min de leitura

O queijo Emmental possivelmente é o mais conhecido dos queijos com olhaduras, e também é conhecido como "queijo Suíço", já que há outros queijos de diversas regiões no mundo no qual o processo produtivo é semelhante. Originalmente, este queijo foi produzido próximo a cidade de Berna, no vale do Rio Emme, na Suíça, e o mesmo continua sendo produzido com leite cru, o qual possui proteção internacional para sua denominação ou o que chamamos de Denominação de Origem Protegida (DOP).
Historicamente, a primeira menção para o queijo "Suíço" foi relatada nos meados do século I d.C., quando o historiador romano Caio Plínio Segundo, também conhecido como “Plínio, o Velho”, que descreveu o que era chamado queijos dos helvéticos ou "Caseus Helveticus", os helvéticos eram confederação de cerca de cinco tribos de Gaule que viviam no planalto suíço, onde era a atual Suíça.

E, no ano de 1815, Rudolf Emanuel Von Effinger ordenou a construção de uma leitaria em Kiesen, perto de Thun, Suiça, a primeira na região do Emmental que se tornou cooperativa. No começo os suíços mantiveram-se relutantes ao consumo do queijo Emmental produzido nas novas leitarias. Entretanto, a partir de 1832, a região de Friburgo viu o aumento de um elevado número de leitarias desse tipo. Com isso, alguns pastores se tornaram queijeiros e iniciaram o trabalho nas diversas leitarias das aldeias. Outros se mudaram para o estrangeiro, principalmente para Europa e a América do Norte, onde se construíram queijarias especializadas em queijo Emmental. E assim, o queijo Emmental se disseminou pelo mundo.
Normalmente, os queijos suíços são produzidos em fôrmas que variam de 70 cm à 1 metro de diâmetro, com altura de 13 à 25 cm, cujo peso é de até 130 kg. A cor de sua casca varia do marrom claro ao amarelo dourado. Apresentando grandes olhaduras, boa flexibilidade, firme e ininterrupta. Esse queijo apresenta sabor suave e traços adocicados.
A fermentação utilizada para o queijo Emmental é a fermentação propiônica, oriunda da fermentação do lactato, pela ação de bactérias propiônicas, utilizando distintas fontes de carbono, como glicose, frutose e galactose, ácidos orgânicos, como ácido lático e ácido cítrico, mas também poliálcoois. O principal microrganismo que realiza esse tipo de fermentação no queijo Emmental é o Propionibacterium freudenreichii subsp. shermanii. No caso do queijo Emmental, essa fermentação ocorre durante o processo chamado maturação. Essa fermentação ocorre mediadas por enzimas de bactérias propiônicas, podendo ocorrer por meio de três diferentes vias metabólicas, a primeira é chamada de Via de Fitz que acontece por meio do metabolismo do ácido lático, a, formando três moléculas de lactato que originam duas de ácido propiônico, uma de ácido acético e uma de dióxido de carbono. Outra via, se chama Via de Wood-Werkman, que ocorre por meio da metabolização do ácido lático em ácido acético, ácido propiônico, ácido succínico e gás carbônico. E a terceira via denomina-se Via de Fermentação do Aspartato, nessa via, a enzima aspartase encontrada em bactérias propiônicas, realiza o processo desaminação (retirada do grupamento amina da molécula) do ácido aspártico, com isso o lactato se acopla ao aspartato, para formação de ácido acético, ácido succínico, amônia e CO2.
Os microrganismos que realizam a fermentação desse queijo são denominados fermentos láticos, são tanto os homofermentativos, quanto os heterofermentativos, isso quer dizer que que produzem ácido lático como produto principal da fermentação da glicose, como também produzem outros substâncias, além do ácido lático, a partir da glicose. No queijo Emmental, utilizam-se culturas termofílicas, ou seja que se desenvolvem a partir de temperaturas elevadas, e em função disso, são utilizadas devido às elevadas temperaturas utilizadas em sua produção, dentre elas estão: o produtor de gases Propionibacterium freudenreichii ssp. lactis, e acidificantes Lactobacillus delbrueckii ssp. lactis, Lactobacillus delbrueckii ssp. bulgaricus, Streptococcus salivarius ssp. thermophilus e Lactobacillus helveticus;
Em relação ao processo de maturação, o queijo Emmental passa por sua primeira maturação pelo período de duas semanas, em temperaturas de 8ºC a 10ºC. Em sua duração, os queijos devem ser virados diariamente, e sua superfície limpa a cada 3 dias, a fim de possibilitar a troca de gases oriunda da fermentação, evitar a umidade excessiva em um dos lados e, também evitar que um dos lados do queijo se torne quebradiço ou com olhaduras mecânicas. Na sua segunda etapa, a maturação do Emmental deve ser realizada de 3 a 6 semanas, em temperatura de 20ºC a 22ºC e virados a cada 3 dias. Em sua última etapa, a maturação ocorre em temperatura de 8ºC a 10 ºC por 8 semanas ou até serem comercializados.

A primeira teoria datada para explicar a formação de olhaduras foi a chamada Teoria de Clark, desenvolvida pelo pesquisador William Clark, na qual descreve que para a formação das olhaduras é necessário a presença de micronúcleos na massa do queijo, pois estes concentram gás formado em diferentes partes do queijo. Esses micronúcleos seriam derivados de bolhas de ar pequenas aprisionadas na massa ou de nitrogênio incorporado ao leite ou à coalhada, ou ainda de olhos mecânicos de tamanho microscópico e pequenas impurezas físicas na matéria prima.
Antes mesmo da fermentação propiônica, a propagação de gás carbônico (CO2) já se inicia, uma vez que quantidades menores de gás são produzidas no decorrer da fermentação lática inicial. Dessa maneira, “micro olhaduras” de 30 a 50 micrômetros surgem e se multiplicam na massa do queijo e muitas delas serão como “sementes” que irão se expandir para a formação de olhaduras maiores. Assim, a produção de dióxido de carbono inicial junta-se com a fermentação propiônica, partindo inicialmente de um a produção de dois litros por dia e encerrando em uma produção de CO2 exponencial, para cinco litros por dia. Ocorrendo uma supersaturação, obtendo-se então a pressão primordial para originar as olhaduras.
Com a saturação da umidade do queijo, o dióxido de carbono produzido se propaga e se acumula nos pontos mais vulneráveis, os micronúcleos, na qual parte do gás se solubiliza na água presente e parte desloca-se para fora da casca. Estabelecendo que o ponto crucial para a formação da olhadura, é a diferença de pressão interna na olhadura e aquela externa, sobre a casca do queijo.
Como forma de explicar a formação das olhaduras em queijos, no ano de 2015 pesquisadores do Agroscope, Instituto de Ciências dos Alimentos com sede em Berna, em conjunto com os cientistas da EMPA (Laboratório Federal Suíço para Testes de Materiais e Investigação) desvendaram o mistério das olhaduras em queijos suíços, como Emmental e Appenzell. A ideia dos cientistas era de que as olhaduras são geradas através de partículas de feno em combinação com bactérias que produzem CO2.
Dessa forma, foi realizado um experimento com oito queijos experimentais de Emmental, os quais foram produzidos com uma repetição de leite microfiltrado com adição de uma quantidade muito pequena de feno em pó ao leite e maturado por 130 dias. E, através de tomografia computadorizada de raios-X (entre 30 e 130 dias) quantificou-se a formação das olhaduras nos queijos.
Os resultados do experimento mostrou que, o número de olhaduras nos queijos poderia ser controlado quase à vontade, dependendo da quantidade de partículas de feno inseridas, demonstrando que as micropartículas de origem vegetal atuam como núcleos oculares que controlam o número e o tamanho das olhaduras no queijo. Basicamente, as partículas de feno contêm algum ar que é unido pelo gás CO2. Se não houver partículas de feno, o CO2 é eliminado do queijo. As partículas de feno só determinam o local e a quantidade de orifícios que serão formados no queijo. Na ausência de partículas de feno, quase nenhuma das olhaduras são formadas, uma vez que o CO2 formado pela ação da bactéria, escapa do queijo. Algumas bactérias que produzem ácido lático formam pouco CO2, de modo que as olhaduras não são desenvolvidas, apesar da presença de partículas de feno. A quantidade de partículas de feno necessária para alcançar as olhaduras necessárias é extremamente pequena: 5 a 10 miligramas em 1000 quilogramas de leite cru são suficientes.
Segundo esses pesquisadores, então a formação das olhaduras nos queijos é principalmente desencadeada por dois fatores: Partículas de plantas funcionando como "pontos de partida das olhaduras" (por exemplo, partículas de feno) e as bactérias que produzem CO2 no queijo.
Finalizamos destacando a importância do conhecimento destes produtos, o conhecimento de diferentes tipos de queijos com olhaduras, como o Emmental e a tradição da produção destes mundialmente, bem como as tecnologias de fabricação de alguns e toda a complexidade nos estudos para entender a formação de suas olhaduras, mostrando que a tecnologia deste queijo vai além da simples aparência. E que cada etapa deve ser respeitada e realizada com higiene e controle de qualidade de toda sua cadeia produtiva, evitando assim defeitos que comprometem suas características sensoriais e garantindo alimento seguro a mesa do consumidor. Esse alimento é rico em vitaminas e cálcio, entre outros nutrientes, entretanto deve ser consumido em quantidades ideais, de acordo com os calculados pelos profissionais de saúde, uma vez que também é calórico. Tendo em mente sempre descascar mais e desembalar menos
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